domingo, 26 de setembro de 2010

Mais do mesmo e a credibilidade da imprensa do vinho

A liberdade de expressão e o papel da imprensa estão sendo amplamente debatidos por conta das últimas declarações do presidente Lula e das eleições que se aproximam. O que vejo nas páginas de política me chama a atenção para um fenômeno que tem me incomodado nos últimos meses: a dúvida sobre a imparcialidade, a criatividade e a honestidade da imprensa especializada em vinhos.

Aqui, coloco também os blogueiros que se auto-intitulam jornalistas, muitos dos quais nunca passaram nem perto de uma faculdade de jornalismo. Mas não é a questão acadêmica que me incomoda, e sim a convivência promíscula entre a suposta imparcialidade jornalística e o marketing escancarado a serviço de produtores e importadores.

É claro que tanto a imprensa quanto blogueiros em geral podem e devem falar bem (ou mal) de vinhos, produtores, lojas e importadores. O que me incomoda é a obviedade do que tenho lido diariamente em revistas, jornais e sites especializados: a repercussão de eventos "boca-livre" patrocinados por empresários do vinho. Quando sei que uma importadora promoverá uma degustação para jornalista e formadores de opinião, já não tenho dúvidas de que, no dia seguinte, lerei dezenas e dezenas de textos iguais, quase cópias dos releases e convites, sobre o sucesso desse ou daquele vinho.

Tudo muito previsível, sem criatividade ou opinião pessoal. E muito compromisso com o promotor do evento, que é sempre enaltecido pelos convidados, nem sempre tão comprometidos em repercutir o que é bom de verdade ou o que realmente é muito ruim. Muitas vezes apenas preocupados em fazer a contrapartida e dar a "notícia" que não traz nada de novo ou de bom para quem procura informar-se sobre vinho.

Não tenho nada contra eventos para divulgação de novos produtos. Mas não acho saudável e nem produtivo que a mídia especializada limite-se a bajular quem promove esse tipo de evento. Sinto falta de avaliações e descobertas de verdade. Sinto falta de gente que garimpa e fala do que não é falado ou vendido pelo marketing da indústria vitivinícola. Leio diaramente publicações e blogs sobre vinhos à procura de novidades, mas no geral leio mais do mesmo. E quase sempre desconfio, pois não vejo verdade ou motivação especial em se falar bem ou mal de um rótulo.

Acho que a imprensa especializada e os formadores de opinião, se é que eles existem, deveriam repensar se querem ter credibilidade e contribuir para a evolução do consumo do vinho de qualidade no país ou se preferem se acomodar nos braços de produtores e importadores que só pensam em empurrar seus produtos para consumidores desinformados e, por que não dizer, traídos por quem deveria orientá-los.

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Casa Marin: excelência no Chile

Não sou de fazer apologia de produtor, média com importadora ou seja lá o quem for, pois acho que todos têm suas virtudes e seus defeitos. Mas o fato é que, a cada garrafa que abro da chilena Casa Marin, fico mais convencido de que, se este produtor não for o melhor daquele país, no mínimo está entre os 3 melhores. Não estou falando de ter o melhor vinho, como um Almaviva, Santa Rita, Don Melchor ou afins - apesar de que o Lo Abarca é um pinot de dar inveja a casas da Borgonha. Estou falando de ter consistência e qualidade em todas as linhas de produtos, da básica à top.

Tocado pela empresária Maria Luz Marin, essa vinícola se destaca não apenas pelos excelentes vinhos, mas pelo pioneirismo e pela consistência. Não é casa de um vinho só, o que demonstra bom terroir, excelência na produção, profissionalismo e competência de quem elabora esses vinhos. A produção vem de San Antonio, onde até pouco tempo não se plantava uva de qualidade, tampouco se produzia vinhos.


O fato é que, desde o pinot noir mais básico até o Lo Abarca, um "Borgonha" sulamericano, é difícil beber algo mediano. Recomento praticamente todos os vinhos, mas destaco, em especial, os pinot, cujo top é o fantástico Lo Abarca, e o sauvignon blanc Cipreses, para mim o melhor da América do Sul feito a partir dessa uva. Hoje, estou me surpreendendo, mais uma vez - ja bebi umas 3 ou 4 garrafas desse vinho -, com o excelente riesling da Casa Marin, que tem a tipicidade e qualidade dos melhores franceses e alemães.

Tá bom, sei que parece exagero - e os preços dos tops da casa realmente são. Mas vale provar antes de reprovar... Eu raramente sou enfático em elogiar uma empresa, mas esta realmente me conquistou.

Mais informações: http://www.casamarin.cl/

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Filosofia de bar a vin

Um professor de filosofia parou na frente da classe e, sem dizer uma palavra, pegou um vidro de maionese vazio e o encheu com pedras. Olhou para os alunos e perguntou se o vidro estava cheio. Todos disseram que sim.

Ele, então, pegou uma caixa com pedregulhos bem pequenos, jogou-os dentro do vidro, agitando-o levemente, e os pedregulhos rolaram para os espaços entre as pedras maiores.

Tornou a perguntar se o vidro estava cheio. Os alunos confirmaram:

- Agora sim está cheio!

Em seguida, pegou uma caixa com areia e despejou-a dentro do vidro, preenchendo o pouco espaço que ainda restava. Olhando calmamente para os estudantes, o professor disse:



- Quero que entendam que este vidro de maionese simboliza a vida de cada um de vocês. As pedras são as coisas importantes - sua família, seus amigos, sua saúde, seus filhos, coisas que preenchem a sua vida.
Os pedregulhos são as outras coisas que importam, como o emprego, a casa, o carro... Já a areia representa o resto, as coisas pequenas. Experimentem colocar a areia primeiro no vidro e verão que não caberão todas as pedras e os pedregulhos. O mesmo vale para suas vidas. Priorizem cuidar das pedras, do que realmente importa. Estabeleçam suas prioridades. O resto é só areia!

Após ouvir a mensagem tão profunda, um aluno perguntou ao professor se poderia pegar o vidro que todos acreditavam estar cheio, e fez novamente a pergunta:

- Vocês concordam que o vidro está realmente cheio?

Todos responderam, inclusive o professor:

- Sim, está!

Então, ele derramou uma taça de vinho dentro do vidro. A areia ficou ensopada, pois o vinho foi preenchendo todos os espaços restantes, fazendo com que, desta vez, ele ficasse realmente cheio.

Todos ficaram surpresos e pensativos com a atitude do aluno, incluindo o professor. Então ele explicou:

- Não importa o quanto a sua vida esteja cheia de coisas e problemas. Sempre sobra espaço para um vinhozinho!

sábado, 4 de setembro de 2010

Enogastronomia e a armadilha do bom gosto

Cada dia que passa estou mais chato com relação a certas situações, e isso não necessariamente tem a ver com a idade, mas certamente tem se agravado com o avanço dela. Por exemplo, hoje em dia eu não vou mais a "baladas", pois o fato de ser revistado na entrada e de ser tratado como mais um moleque louco por uma cerveja me deixa extremamente irritado. Ficar em filas de espera e ser servido como um morto de forme, por um garçom que parece estar fazendo um favor, é outra situação que não aceito mais, fato que também tem me afastado de lugares da moda.

E esse meu "mau humor" se aplica igualmente aos meus "hábitos alimentares". Está cada vez mais difícil escolher um lugar para jantar ou almoçar, pois o conjunto de fatores que passei a considerar no meu CFG (Coeficiente de Felicidade Gastronômica) está cada vez maior e mais complexo. Por exemplo, não consigo mais ir a um bom restaurante italiano ou francês e não beber um bom vinho. Mesmo em uma cantina italiana ou em um restaurante mais simples não me vejo bebendo outra coisa. A idéia de comer uma massa ou um risoto acompanhado de cerveja ou qualquer outra bebida me embrulha o estômago. Sempre fui bebedor de cerveja, coisa que ainda faço bastante, mas quase sempre em bares, churrascos, pubs ou situações específicas. Mas raramente saio do vinho quando quero fazer uma refeição de verdade.

Esse "fenômeno" tem se agravado nos últimos tempos e talvez explique a minha busca por restaurantes que não apenas sirvam boa comida e tenham bom atendimento, mas que também ofereçam boa e honesta carta de vinhos ou que permitam ao cliente trazer sua própria garrafa, a uma taxa justa. O fato é que, hoje, um almoço ou um jantar não são mais, para mim, apenas uma refeição. São momentos em que não quero mais apenas matar a fome; são, principalmente, eventos em que busco alcançar o maior prazer possível. E isso se aplica ao simples almoço que antes eu costumava fazer rapidamente, apenas para matar a fome durante um passeio, e que agora passaram a ser o momento principal da programação. O passeio passou a girar em torno da refeição!

Aparentemente, não há nada de mal em encarar a vida dessa forma, não fosse o "sofrimento" e o custo decorrentes disso. Trocar uma pizza com cerveja por um espaguete aos frutos do mar acompanhado de um belo riesling não é trocar seis por meia dúzia em termos financeiros. Ir ao shopping fazer compras e trocar o filé com fritas e o refrigerante da praça de alimentação pelo buffet do Bar des Arts ou pelo Ruffino's também não é lá uma troca equilibrada. É sair, literalmente, da água para o vinho, com todos os custos e as dificuldades que isso implica no Brasil.

Tenho percebido que, além de mais chato e crítico, possivelmente eu esteja menos feliz, pois não é fácil comer e beber bem o tempo todo. O que me fazia feliz há cinco anos já não me empolga mais, e cada dia que passa eu tenho mais dificuldade para tirar prazer de uma refeição, poir mais paradoxal que isso possa parecer, já que, hoje, eu tenho muito mais conhecimento, repertório, capacidade e sensibilidade para isso.

Descobri essa "armadilha enogastronômica" pouco tempo atrás, numa noite em que eu tinha pouco tempo e dinheiro para gastar. Ao pesquisar em revistas e na internet um lugar que atendesse a esses requisitos e que, ao mesmo tempo, tivesse a qualidade desejada, descobri que teria de ficar em casa mesmo e pedir uma pizza. Mas onde pedir uma pizza de alta qualidade, digna de acompanhar um belo vinho, que já estava pronto para ser abatido na minha adega?